terça-feira, 4 de agosto de 2015

Strike!

A vida é um jogo de boliche. No começo, milhares de pinos, você não sabe diferenciar um do outro, todos tão próximos e unidos. Mas quando a bola (vida) começa a rolar, sabe que alguns vão cair.

O que sempre me fez ver certa semelhan
ça com a realidade. Todas aquelas pessoas ao seu redor formando uma unidade, até você ir descobrindo que muitos não vão se manter íntegros até o fim da jogada. Por isso caem. 

Certa vez, ao contar essa teoria maluca prum amigo, ele disse: “Cuidado pra não fazer strike, hein!” - E hoje, anos depois, posso contar nos dedos os pinos que sobraram.

Mas, ao final de cada jogada, o que consola é saber que novos pinos serão colocados no lugar.

terça-feira, 2 de junho de 2015

Coisas simples

Porque às vezes a gente tem que parar pra observar as coisas mais simples.

Um céu extremamente estrelado.
Um final de tarde particularmente azul.

Um tapete de pétalas na praça aqui perto de casa.

segunda-feira, 27 de abril de 2015

O tempo e o vento

Sou uma pessoa que vive descabelada. O fio do meu cabelo é muito fino e qualquer ventinho já o deixa todo revirado. No trajeto diário ao trabalho, pego uma saída de metrô onde há uma corrente de vento muito forte. Então já viu: chego no serviço com uma aparência digna de Elba Ramalho.

Num desses dias, subindo a escada rolante do metrô, peguei a famosa corrente de vento à la furacão e pensei: "Vento filho da...! já revirou todo o meu cabelo!". No mesmo instante, para ao meu lado na escada um garotinho nos seus cinco ou seis anos, e diz: "Aah que ventinho bom!!".

Na mesma hora parei e, vendo o contraste da coisa, pensei: "Cara! Como o mesmo degrau de uma escada pode conter pontos de vista tão diferentes?". O menino encarava tudo numa boa e os ventos estavam a favor dele. E acho que não à toa ele parou do meu lado: eu precisava perceber que, em algum momento da vida, desaprendi a gostar do sabor do vento. Onde perdi isso? No tempo. Na distância de mais de vinte anos que me separava daquele garotinho, a vida adulta me fez deixar de me levar pelo vento. E eu e o garoto subíamos a escada para a mesma direção. Fiquei preocupada que ele chegasse ao mesmo lugar que eu quando adulto.

Outro dia, no avião, eu lia uma crônica sobre um pedaço de isopor que voava ao sabor do vento até encontrar um garotinho que o transformou em barco e mudou todo o seu destino. O garoto foi embora sem se dar conta de que tinha mudado o destino do pedaço de isopor. Foi mais ou menos o que aconteceu aquele dia no metrô, mas ao contrário da crônica que li no livro, ao encontrar o garotinho, passei a voar mais ao sabor do vento.

quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Dente-de-leão

Onde quer que eles passassem, a flor sempre aparecia. Branca e redonda como algodão. Eles a arrancavam da terra e sopravam juntos, vendo os fiapos brancos dispersarem-se no ar. Às vezes o próprio vento fazia o trabalho, antes mesmo de soprarem. Em questão de segundos, o que era flor estava desfeito.

Nada é mais irônico do que dente-de-leão: nome forte pruma flor tão frágil. Que se desfaz à menor brisa. Assim como alguns relacionamentos. Talvez por causa disso eu e ele tenhamos confundido a fragilidade da flor com a do amor, o arrancamos da terra firme e sopramos, vendo as lembranças voarem em mil pedaços ao sabor do vento.  Quando percebemos, era tarde. Em segundos, o que era amor estava desfeito.

Há coisas que se desfazem com um sopro. E talvez seja essa a função do dente-de-leão no mundo: mostrar a efemeridade das coisas. Lembrando que sempre nascerão outras flores, basta saber o tipo de semente que se tem em mãos.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Relatividades

Lá pelas tantas da madrugada, foi jogar uns papéis no lixo quando se deu conta de uma luz forte do lado de fora. Abriu o vidro da janela e, assustada, viu q a luz era rosa, forte e provinha de um objeto voador estranho, que levantava voo e propagava uma rede de luz gigantesca, a qual piscava freneticamente ao seu redor. Foi correndo pegar a câmera, mas assim q ligou, a luz do objeto voador foi desligada. Como se tivessem percebido. Desolada, voltou para a sala e recomeçou a guardar umas maquiagens dentro da bolsa, coisa q fazia antes de avistar o tal disco voador no céu. De repente, se deu conta da futilidade de sua situação: “Eu aqui, me preocupando em guardar maquiagens, enquanto coisas muito mais avançadas acontecem no universo!”. Ficou um tempão parada, olhando pro nada e entendendo tudo. Percebeu como as preocupações do ser humano são fúteis diante da grandiosidade do universo. Que ela nunca iria desvendar.

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Olhando de fora





"Como se eu estivesse por fora do movimento da vida. A vida rolando por aí feito roda-gigante, com todo mundo dentro, e eu aqui parada, pateta, sentada no bar. Sem fazer nada, como se tivesse desaprendido a linguagem dos outros. A linguagem que eles usam para se comunicar quando rodam assim e assim por diante nessa roda-gigante. Você tem um passe para a roda-gigante, uma senha, um código, sei lá. Você fala qualquer coisa tipo , por exemplo, então o cara deixa você entrar, sentar e rodar junto com os outros. Mas eu fico sempre do lado de fora. Aqui parada, sem saber a palavra certa, sem conseguir adivinhar. Olhando de fora, a cara cheia, louca de vontade de estar lá, rodando junto com eles nessa roda idiota" 


(Caio Fernando Abreu)


(imagem retirada do Google)

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Realidade turva

Ela parou em frente à porta de vidro e tentou abrir. Nada. Empurrou com mais força e descobriu que estava trancada. Olhou as pessoas lá dentro - como tinham entrado?  - comendo e conversando alegremente, sem notar sua presença em frente à porta. Só foi vista por uma senhora bem velhinha (em contraste com a loja tinindo de nova, recém-inaugurada) que a observava lá de dentro sem dar muita importância, como se visse apenas mais um elemento monótono da paisagem. 

Então, para chamar a atenção, começou a bater na porta e a acenar freneticamente. Ninguém viu. O vidro tornava a realidade do outro lado anos-luz distante do agora. Todos pareciam viver em uma dimensão paralela, como um filme mudo rolando do outro lado do vidro, uma festa sem som da qual ela não participava. 

Passaram mil coisas pela sua cabeça. Tinha chegado atrasada, obviamente, e ficou trancada por fora. Ninguém queria saber de mais gente lá dentro. Ou aquelas pessoas eram todas convidadas VIP. A porta continuava trancada, assim como a sua percepção da realidade. Depois de muito tempo e esforço para se fazer notada e quase desistindo, se deu conta de que havia outra porta, muito maior, na lateral do recinto. Estava aberta, sem impedimentos, o que não havia notado porque passou muito tempo olhando para a outra porta, trancada. Embora o vidro fosse transparente, sua percepção continuava turva.


 
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