domingo, 9 de maio de 2010

O casarão

Todas as noites ela pegava ônibus no mesmo lugar. Enquanto esperava, a avenida movimentada e o trânsito caótico a distraíam. Do outro lado da rua, estava o casarão. Ela já havia reparado nele. A construção robusta fazia-se notar pela imponência que representava: ocupava um quarteirão todo. As paredes de tijolos expostos dividiam espaço com janelas grandes de vidros escuros, que impediam a visão do interior. Como se fosse um castelo medieval, o casarão possuía uma torre ao lado direito, e era lá que caíam intensos relâmpagos quando chovia. Talvez pela existência de algum para-raios no local. Ou então era a natureza querendo dar um ar ainda mais sinistro à construção.

O ruído do ônibus chegando interferiu em seus pensamentos e ela parou de pensar no casarão. Subiu no veículo e foi embora, deixando pra trás os devaneios.


No dia seguinte, após o serviço, esperava o ônibus no mesmo lugar. Olhando pro casarão do outro lado da rua, uma coisa chamou-lhe a atenção: havia luz na parte inferior. Era uma porta! Viu algumas pessoas entrarem e saírem dali. Movida pela curiosidade, não pensou duas vezes e foi até lá. O que haveria dentro daquele monumento tão misterioso?

Ao entrar pelas portas de vidro, foi atingida por uma onda de ar frio, proveniente do ar-condicionado. E qual não foi sua surpresa quando notou que havia gente, muita gente dentro do local! Viu uma escada rolante que dava num supermercado e também uma praça de alimentação onde famílias reunidas jantavam, conversando animadamente. Era um lugar acolhedor. Bancos estofados e muitas luzes deixavam o ambiente confortável. Ela logo foi absorvida por aquela atmosfera tão interessante e, nos dias que sucederam, passou a almoçar lá, ou então sentava na praça de alimentação apenas pra pensar e observar as pessoas. Ela não podia entender aquele contraste do interior do casarão, tão cheio de vida, com o seu exterior tão sombrio.

Foi então que compreendeu por que se atraiu tanto por aquele casarão: ele era como ela. Uma fortaleza de tijolos, aparentemente fechada e cheia de janelas escuras, mas por dentro tão cheia de amor e vida, que somente aqueles que invadissem seu interior poderiam conhecer de verdade. Sim, ela compreendeu enfim.

Passou a enxergar casarão como se ele fosse um espelho. E dessa vez, antes de subir no ônibus, olhou praquela antiga construção e achou que algumas partes precisavam ser reformadas.


(imagem retirada do Google)

6 perdidos por aqui:

Ivana disse...

Às vezes as aparências nos enganam. As pessoas só passam a nos ver como realmente somos, quando nós também passamos a nos enxergar, a olhar para dentro de nós, com tudo que temos; ternura, amor, gentileza e carinho. E olha que temos muita coisa boa guardada ou escondida dentro de nós que as pessoas não tem como ver, às vezes nós mesmos não vemos, precisamos de "Um Casarão" para nos enxergar. Um grande abraço!

angela disse...

Antes assim com um interior cheio de luz e amor. O de fora é mais facil arrumar do que iluminar por dentro.
Lindo conto.
beijos

Rodrigo Cavaleiro disse...

É de seu conhecimento que leio seus post. Agradeço o seu novo...

Novamente aprecio o conteúdo ...
e pelo fato de estar a escrever um post, meu... um espírito questionador assumirá !

É realmente raro esses locais de construção antiga. Tomam nossa atenção e inspiram os pensamentos. Quanto a sua curiosidade, "já estou acostumado". Fico razoavelmente satisfeito.

E já que se comparou com o castelo, deixe-me dizê-la ...

Vez em quando, alguém tenta algum contato com o que está dentro do muro ...
Por vezes cai nas águas que o cercam, onde os jacarés o devoram; outras a ponte levadiça desce e o esmaga; em alguns momentos um arqueiro o acerta do alto da torre; ou seus muros altos ignoram os chamados...

Espero que possa fazer parte da sua reforma. E conhecer o que está dentro de toda essa fortaleza. E que nenhum daqueles fatos acima ocorra ... afinal, ainda sou "jóvem" com quase 27 anos.

Beijo enorme no pé !
mininu_nu@hotmail.com

Hipérboles disse...

Gostei daqui, também tenho um achados e perdidos, não sei se tão bom quanto o seu!

Um abraço achado.

Erika disse...

Que lindo texto, vou indicar no twitter! Bravo!

Elaine Gaspareto disse...

Karina,
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